
Metodologia de aprendizagem e ensino
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INTRODUÇÃO
Os jogos esportivos coletivos (JEC) caracterizam-se pela contínua interação dos elementos constitutivos do rendimento esportivo em um contexto puramente tático - situacional. Moreno (1994) classifica os JEC no interior do grupo dos denominados esportes de cooperação – oposição. As ações de jogo resultam das interações dos participantes, produzidas de forma que uma equipe coopere entre si para opor-se a outra que age também em cooperação e que se opõe ao anterior. Os JEC podem ainda ser analisados em relação ao uso do espaço: compartilhado, isto é, existe invasão do campo do adversário (handebol, basquetebol) ou não (voleibol). Um outro elemento importante na classificação refere-se à forma de participação dos jogadores: alternada (por exemplo: squash, tênis, badminton) ou simultânea (por exemplo: basquetebol, futebol, futsal). De acordo com Moreno e Ribas (2004), o vetor predominante das tarefas motoras nos JEC refere-se aos aspectos informacionais, perceptivos e de tomada de decisão.
Partindo do modelo do ato tático proposto por Mahlo (1970), em que o autor considera toda ação de jogo necessariamente tática, os comportamentos dos jogadores são conscientes e orientados a um objetivo. As bases científicas e teóricas para considerar a imperiosa necessidade de uma formação tática nos JEC estão desta forma claramente determinadas (TAVARES, 2002). Segundo Greco (1998, 1999), os modelos de ensino – aprendizagem – treinamento (E-A-T) orientados em concepções do desenvolvimento da capacidade tática possibilitam que os praticantes realizem uma apropriação inteligente do uso dos elementos técnicos necessários à solução das diferentes situações de jogo. Portanto, o desenvolvimento das capacidades cognitivas de percepção, antecipação e tomada de decisão necessárias para direcionar a ação de jogo ao objetivo específico são fatores condicionantes do processo de E-A-T.
A habilidade de selecionar respostas adequadas nos JEC, segundo Thomas et al. (1986), requisita do atleta um conhecimento tático sobre o jogo e as ações. Para Nitsch (1986), citado por Samulski (2002), a ação é “um processo intencional dirigido a um objetivo e regulado psiquicamente”. Sabe-se que em toda ação humana os processos são dinâmicos, motivados e realizados através de diferentes formas de comportamento dentro de um contexto social (SAMULSKI, 2002).
De acordo com Housner e French (1994), o conhecimento tático no esporte está baseado no conhecimento declarativo e processual, evidenciando que os atletas empregam diferentes processos cognitivos nas situações de jogo. O conhecimento declarativo no esporte, segundo Thomas et al. (1986), refere-se ao conhecimento do regulamento, das posições dos jogadores e estratégias básicas de defesa e ataque (saber o que fazer). Contudo, esta definição é bastante limitada, pois o conhecimento declarativo também se relaciona com aspectos como escolha de alternativas táticas que superam a questão do conhecimento das regras. Já o conhecimento processual seria utilizado para criação de ações, saber como e quando agir, selecionando as ações mais adequadas de acordo com as diferentes situações da competição (FRENCH; THOMAS, 1987; MC PHERSON; THOMAS,1989; TURNER; MARTINEK, 1995)
Nesta ordem de idéias, o basquetebol como JEC solicita de processos de EA-T adaptados às características próprias da modalidade esportiva. De acordo com Rodrigues (2001), o basquetebol apresenta uma grande variabilidade de situações, exigindo do atleta a capacidade de processar um elevado e variado número de informações em um curto espaço de tempo, de forma a possibilitar a realização de ações técnico - táticas com base na sua capacidade de tomada de decisão. Portanto, no processo de E-A-T a estruturação das atividades e a distribuição de conteúdos assumem especial importância no quadro de planificações e condução do processo. As atividades planificadas que sejam inerentes ao processo de E-A-T constituem-se em um dos mais importantes meios para melhoria do rendimento dos jogadores nos diferentes níveis de expressão da sua performance (SAAD, 2002).
De acordo com Bayer (1986), o processo de E-A-T dos jogos esportivos coletivos com crianças deve possibilitar a realização de atividades cujos conteúdos oportunizem um desenvolvimento psicológico, fisiológico, emocional e social, respeitando seu estágio atual de maturação; a iniciação esportiva em basquetebol não pode ser indiferente perante este processo. Já para Garganta (1995), o processo de ensino dos jogos esportivos coletivos não deve procurar somente a transmissão de um conjunto de habilidades técnicas e capacidades, também deve oportunizar a formação do jogador inteligente com capacidade de tomada de decisões e de adaptações às condições que o jogo oferece. Partindo deste princípio é necessário que o jogo e as experiências lúdicas sejam o meio preponderante no qual o professor recorre para estabelecer os primeiros passos da criança nos jogos esportivos coletivos.
Especificamente no basquetebol, De Oliveira e Paes (2004) consideram que o ensino desta modalidade deve ser um processo baseado em novas pedagogias e metodologias cujos conteúdos ofereçam diferentes alternativas para o processo de formação.
Finalmente, De Rose e Tricoli (2005) afirmam que a iniciação esportiva no basquetebol deve estar baseada em quatro pontos essenciais: diversidade, inclusão, cooperação e autonomia, os quais garantem um oportuno desenvolvimento da criança acorde com suas necessidades e prioridades.
1.1 Objetivos
1.1.1 Objetivo Geral
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Verificar a influencia de diferentes metodologias empregadas no processo de E-A-T sobre o nível de conhecimento tático processual de jogadores da categoria mini-basquete (10-12 anos).
1.1.2 Objetivos Específicos
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Caracterizar as metodologias empregadas no processo de ensino-aprendizagem-treinamento implementado em equipes pertencentes à categoria mini-basquete;
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Identificar a efetividade de diferentes metodologias de E-A-T sobre o nível de conhecimento tático processual em equipes pertencentes a categoria minibasquete.
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Hipótese
H1 – O método situacional-global é capaz de provocar melhorias nos parâmetros “oferecer-se e orientar-se” e “reconhecer espaços” do conhecimento tático processual de praticantes de Basquetebol da categoria mini-basquete;
H2 – O método situacional-misto é capaz de provocar melhorias nos parâmetros “oferecer-se e orientar-se” e “reconhecer espaços” do conhecimento tático processual de praticantes de Basquetebol da categoria mini-basquete;
H3 – O método analítico é capaz de provocar melhorias nos parâmetros “oferecer-se e orientar-se” e “reconhecer espaços” do conhecimento tático processual de praticantes de Basquetebol da categoria mini-basquete;
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Justificativa
No contexto da educação atual, uma das mudanças mais representativas é a preocupação por promover nos alunos a capacidade de aprender a aprender. Na área da educação física, acredita-se que isto é possível, através da aquisição de estratégias e habilidades que oportunizem a apropriação de novos conhecimentos. A solução de problemas é um dos meios mais adequados para induzir nos alunos o processo de aprender a aprender. Esse estilo se caracteriza pela apresentação de situações abertas e sugestivas que requisitam do aluno uma atitude ativa e um esforço para procurar suas próprias respostas e próprio conhecimento (ECHEVERRÍA; POZO, 1998).
Os modelos de E-A-T nos JEC, centrados no desenvolvimento da compreensão tática, oportunizam no aluno a construção do seu próprio conhecimento técnico – tático e ao mesmo tempo, evitam que os praticantes sejam condicionados a um desgastante processo de especialização precoce. Gimenez (2005) afirma que os modelos alternativos de E-A-T reconhecem que a criança ainda não consegue reproduzir o gesto técnico correto de forma imediata e que perante o problema motor proposto o aluno responde com adaptações. Este tipo de adaptações são estratégias de solução dos diferentes problemas que defronta tanto na aprendizagem quanto na competição. Greco (1999) afirma que os métodos centrados na tática, nas denominadas novas correntes metodológicas, oportunizam positivamente o desenvolvimento das capacidades cognitivas de percepção, atenção, antecipação e tomada de decisão. Estes componentes inerentes às capacidades tático-cognitivas interagem com as demais capacidades necessárias ao rendimento esportivo de forma a possibilitar uma adequada performance (GRECO, 1999). O emprego desses modelos permite ao praticante alcançar altos níveis de motivação e seu aprendizado se consolida através de situações – problemas reais do jogo.
Nista-Piccolo (2005) afirma que ensinar a praticar esportes é oportunizar ao aluno a execução de determinadas habilidades ou gestos por meio da descoberta do prazer de se exercitar.
Nessa ordem de idéias, Gimenez (2005) afirma que nas últimas décadas a pesquisa na área dos modelos de E-A-T nos JEC direcionou-se a observar resultados conforme métodos tradicionais, orientados na técnica e métodos alternativos, centrados na tática. Com o desenvolvimento da psicologia cognitiva e os avanços nas áreas da aprendizagem motora hoje se interpreta melhor a relação entre cognição e ação, a maneira com que o conhecimento oportuniza a ação e como a ação facilita a construção do conhecimento. Grande parte das pesquisas tem empregado modelos quase-experimentais nos quais o conhecimento (declarativo e processual) tem sido avaliado por meio de testes escritos. O rendimento dos atletas foi analisado através da observação do jogo com o intuito de mensurar os componentes de controle, decisão e execução e as habilidades esportivas por meio de diferentes testes técnicos (GIMENEZ, 2005). O intuito da utilização deste tipo de delineamento é aproximar o experimento a ambientes mais semelhantes à realidade e, desta forma, controlar ameaças à validade interna (THOMAS; NELSON, 2002).
Gimenez (2005) elaborou uma revisão dos diferentes estudos realizados na área da didática e metodologia nos JEC (vide quadro 1), objetivando comparar entre métodos tradicionais e métodos alternativos. Alguns desses estudos citados (BOUTMANS, 1983; DURAN; LASIERRA, 1987; MC MORRIS, 1999) já compararam as vantagens do método analítico e o método global na aquisição das habilidades técnicas e da tática, em crianças de 11 a 16 anos de idade, praticantes das modalidades esportivas basquetebol, voleibol, hockey e futebol. A duração dos experimentos compreendeu entre 06, 16 e 17 sessões de treino. Já Lawton (1989) comparou a influência do método tradicional e o método proposto por Bunker e Thorpe (1982), Thorpe, Bunker e Almond (1986), denominado “teaching games for understanding” (TGFU) na aquisição dos fundamentos técnicos e o nível de conhecimento tático no badminton. Os resultados obtidos não apresentaram diferenças significativas entre os grupos, o qual pode ter ocorrido pela duração do experimento que foi de 06 sessões de treino.
Com base nessa revisão, é pertinente considerar que ao se delinear estudos relativos à avaliação do conhecimento (declarativo e processual), um dos instrumentos mais empregados para conhecer o nível de desenvolvimento destes construtos foi o questionário. Este instrumento requer do participante determinado conhecimento sobre regulamento da disciplina esportiva bem como às vezes lhe é solicitado também que responda a questões relativas à capacidade para propor soluções nas diferentes situações – problemas mais comuns da modalidade. Porém, a aplicação deste instrumento não permite uma diferenciação entre o nível real de conhecimento declarativo e processual. Na literatura consultada, a capacidade de declarar ou narrar aquilo que o sujeito tem armazenado na sua memória é denominado como conhecimento declarativo. Já o conhecimento processual é a capacidade de gerar ações e executá-las (ECHEVERRÍA; POZO, 1998; EYSENCK; KEANE, 1994; SQUIRE; KENDAL, 2003). Prova dessa diferenciação são os diferentes estudos realizados com o intuito de avaliar e conhecer o nível de desenvolvimento do conhecimento declarativo por meio de instrumentos que solicitam ao indivíduo voluntário declarar e justificar sua resposta (vide quadro 2). Com o avanço tecnológico dos anos noventa a dois mil, esses instrumentos incorporaram seqüências de imagens de jogo em vídeo com, por exemplo, questionários de escolha múltipla sobre regras e princípios de jogo, esquemas de jogo ou situações reais de jogo para o atleta decidir e justificar qual a melhor solução. Também se desenvolveram testes gráficos, de observação e análise do comportamento tático no jogo, entre outros.
Outra característica importante nos estudos revisados consiste na preocupação observada de se planejar e executar intervenções com base na aplicação de programas de ensino conforme modelos tradicionais e alternativos. Essas intervenções tiveram uma duração que variava de 6 a 38 sessões de treino. A duração do tratamento condiciona o produto, ou seja, os resultados esperados. Assim, observa-se que nos estudos nos quais o tratamento teve uma duração de 06 e 12 sessões não houve diferenças significativas no nível de rendimento expresso conforme as metodologias aplicadas como se observa no quadro 1. (GABRIELE; MAXWELL, 1995; GRIFFIN; OSLIN; MITCHELL, 1995; MITCHELL; GRIFFIN; OSLIN, 1995; STUART; THORPE, 1997). A partir desses resultados, considerou-se pertinente realizar intervenções, com um mínimo de 18 sessões, para se conhecer claramente as possíveis diferenças significativas entre os grupos testados.
Com base na prévia revisão de literatura e apoiado na análise de diferentes estudos desenvolvidos na área do ensino nos JEC, o presente estudo pretendeu abordar três aspectos que ainda não foram considerados em trabalhos anteriores.
O primeiro deles foi avaliar o nível de conhecimento tático processual em praticantes de basquetebol da categoria mini-basquete. Utilizou-se como auxílio para tal, a bateria de testes KORA (MEMMERT, 2002). Este instrumento desenvolvido e validado por Memert (2002), oportuniza a avaliação das capacidades táticas oferecer-se e orientar-se, bem como reconhecer espaços por meio de situações de jogo de 3 x 3 e 4 x 3 que são típicas nos JEC.
O segundo aspecto visou analisar e identificar como se procede no E-A-T no basquetebol através da categorização e estruturação de dezoito (18) sessões de treino conforme o protocolo estabelecido por Stefanello (1999) e adaptado tanto para o voleibol por Nascimento e Barbosa (2000), quanto para o futsal por Saad (2002) e Moreira (2005). Este procedimento visa descrever o processo didático metodológico empregado pelo professor ao invés de planejar algum tipo de intervenção como foi evidenciado em certos estudos revisados (FRENCH; THOMAS, 1987; GABRIELE; MAXWELL, 1995; GRIFFIN; OSLIN; MITCHELL, 1995; MC PHERSON; THOMAS, 1989; MITCHELL; GRIFFIN; OSLIN, 1995; STUART; THORPE, 1997; TURNER; MARTINEK, 1995). Acredita-se que desta maneira possa ser atingida uma alta validade ecológica e aplicabilidade desta pesquisa nos contextos reais das aulas de educação física e esporte.
O terceiro aspecto atendeu à falta de estudos relacionados ao nível de rendimento do conhecimento tático processual em crianças da categoria minibasquete que praticam a modalidade. Por questões de tempo limitou-se a observar somente 18 sessões de treino.
Finalmente, pode–se complementar observando que a evolução da pesquisa nesta área visa cada vez mais à elaboração de estudos com alta validade ecológica, bem como o emprego de instrumentos e protocolos que oportunizem uma adequada avaliação da tomada de decisão dos atletas nos JEC sob contextos semelhantes aos que se apresentam no treino e na competição.
1.4 Delimitação do estudo.
Este estudo delimitou-se em identificar o nível de conhecimento tático processual em crianças pertencentes a três times de basquetebol da categoria minibasquete na cidade de Belo Horizonte/Brasil. Na população observada, os professores-treinadores declararam que utilizam métodos de ensino–aprendizagem– treinamento (E-A-T) específico (grupo A: método situacional, grupo B: método misto e grupos C: método analítico) no desenvolvimento das atividades propostas nas diferentes sessões de treino. Observou-se nas instituições pesquisadas que os professores empregam os métodos: analítico, método situacional e método misto (utilização do método analítico, global e situacional). Os resultados deste estudo não podem se generalizar a outras categorias e/ou outros métodos de E-A-T.
Conforme as características da amostra considerou-se adequado não realizar uma comparação dos resultados obtidos pelos grupos de acordo com os métodos de E-A-T utilizados. Um dos motivos consiste na experiência motora de cada uma das crianças consideradas neste estudo. Essas têm sido diferentes, envolvendo aprendizados tanto formais quanto incidentais. Portanto, realizar uma comparação entre grupos seria desconhecer o peso desa variável e sua influência no momento de avaliar a efetividade e eficácia de um método de E-A-T na aquisição de determinado nível de conhecimento tático processual. Porém, o estudo foi estruturado para conhecer a evolução desta variável no interior de cada grupo e possibilitar desta maneira uma descrição detalhada do processo de E-A-T e sua influência no nível de conhecimento tático processual. Estudos em outras categorias e faixas etárias, bem como gêneros serão desenvolvidos posteriormente pelo grupo de estudo do Centro de Estudos de Cognição e Ação (CECA) do Lapes/CENESP- UFMG.
PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM-TREINAMENTO NO BASQUETEBOL: INFLUÊNCIA NO CONHECIMENTO TÁTICO PROCESSUAL